Questionamentos ao Feminismo Neoliberal como insuficiente para lidar com vários temas sociais e a necessidade de traçar um novo modelo de Feminismo que dê conta da amplitude das questões propostas pela sociedade atual deram o tom da palestra “Capitalismo, Feminismo e a Astúcia da História”, proferida pela professora do Departamento de Filosofia e Política da New School for Social Research de Nova Iorque, Nancy Fraser.
O evento, realizado na manhã de 03/11, foi promovido pelo Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (NEIM/UFBA) e atraiu um público formado por vários segmentos da Universidade, ao Salão Nobre da Reitoria. Segundo o Reitor, João Carlos Salles, foi uma grande honra para UFBA realizar uma atividade que contou com a presença da professora Nancy Fraser, uma das pesquisadoras mais respeitadas na atualidade.
Também apoiaram o evento o PPGNEIM (Programa de Pós-graduação em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo), o PPGCS (Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais) e o BEGD (Bacharelado em Estudos de Gênero e Diversidade).
Quebrando "tetos de vidro"
A professora Nancy Fraser que se identifica como pensadora, integrante da geração da nova esquerda, cuja ascendência ocorreu nos anos de 1960, reconheceu equívocos cometidos pela segunda onda do Feminismo que, atuando nos estados de bem-estar social, não debruçou-se sobre questões sociais de uma sociedade hierarquizada com estrutura racializada e remunerações cada vez mais precárias. Ela exemplificou citando um pequeno número de mulheres que seguem “quebrando tetos de vidros” ao assumir altos postos em grandes empresas mas, por trás desse sucesso feminino, está uma maioria de mulheres de classes sociais mais baixas e outras etnias que limpam casas, tomam conta de crianças e idosos. “Elas são pessoas que vivem uma cidadania de segunda classe”, considerou Fraser.
Por isso, a pesquisadora defendeu que é preciso rejeitar o feminismo cuja orientação está voltada para o mercado, pois permite que poucas ascendam, mas delinear um modelo que lute por políticas sociais necessárias em várias áreas, na atual configuração do capitalismo. “Não só questões relacionadas a injustiças de gênero, mas substituir o ideal da igualdade por temas que favoreçam a redistribuição, reconstrução e representação das mulheres, permitindo-as participar de todos os aspectos da vida social”, sustentou a professora.
Ela criticou a atual política do modelo de produção em detrimento da reprodução e cuidado social. “Atualmente, são necessárias mais horas para o sustento das famílias, em consequência da precarização das remunerações, o que demanda mais energia e menos tempo disponível. Junte-se a isso, o cada vez menor apoio estatal com a limitação da assistência em vária áreas." E por fim, Fraser racionalizou que “generaliza-se a crise – interna, política, nacional, internacional e transnacional, que o capitalismo não é capaz de controlar”.
Para dar conta do atual estágio do capitalismo, Nancy Fraser acredita que o Feminismo precisar estar concectado a questões de classe, raça, etnia, de ecologia, de economia e etc... “Não se combate o capitalismo neoliberal com ações segmentadas”, destacou, acentuando que o gênero está interseccionado com todas as áreas da sociedade e precisa engajar-se com todas elas. Para Nancy, o Feminismo não pode ser um movimento isolado, e desse modo, é fundamental um projeto de transformação para um modelo mais abrangente.
Nancy Fraser
Nancy Fraser é professora de Filosofia e Ciência Política na New School for Social Research, em Nova York, e diretora da Cátedra de Pesquisa Internacional em “Justiça Global” no Collège d’études Mondiales em Paris. Ao longo das últimas décadas, tem publicado livros altamente reconhecidos sobre temas relacionados às teorias da justiça, democracia, opressão e feminismo.
Entre as suas principais obras, destacam-se: “Fortunes of Feminism: From State-Managed Capitalism to Neoliberal Crisis” (2013), “Scales of Justice: Reimagining Political Space in a Globalizing World” (2008) e “Feminist Contentions: A Philosophical Exchange” (1994), em co-autoria com Seyla Benhabib, Judith Butler, e Drucilla Cornell.