Três alunos da primeira turma da Residência Técnica AU+E (Residência em Arquitetura, Urbanismo e Engenharia, curso de Especialização em Assistência Técnica para Habitação e Direito à Cidade promovido pelo Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da UFBA) concluíram seus percursos de aprimoramento profissional com a doação de inéditos projetos de assistência técnica à Comunidade Remanescente do Quilombo Rio dos Macacos, localizada em Simões Filho, em território contíguo à área atualmente ocupada pela Base Naval de Aratu, gerida pela Marinha.
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Os projetos possibilitaram à comunidade a traduzir em linguagem técnica conhecimentos ancestrais acerca do território onde vivem, aumentando assim as chances de levantar recursos junto a governos e órgãos de fomento para melhorar as condições de vida no local. Desenvolvidos ao longo de cerca de dois anos de trabalho em coautoria com os membros da comunidade, os estudos técnicos assinados pelos residentes definem diretrizes para a construção de um centro de convivência e de uma casa de produção de farinha no terreno remanescente quilombola, além de mapeamentos dos potenciais produtivos e territoriais da área.
Os projetos - assinados pela arquiteta Luana Figueiredo ("Projeto Semente: Centro Comunitário Rio dos Macacos"), pelo urbanista Leonardo Polli ("Diretrizes Territoriais Preliminares para o Quilombo Rio dos Macacos") e pela geógrafa Paula Regina Cordeiro ("Diretrizes produtivas da comunidade quilombola de Rio de Macacos") - foram doados oficialmente aos moradores no dia 15/01, em um ato público realizado na área quilombola. Além dos residentes e de dezenas de moradores, estiveram presentes o professor Fábio Velame (da SUMAI, representando o reitor João Carlos Salles), a professora Naia Alban (diretora da FAUFBA) e a professora Ângela Gordilho, do PPG-AU, coordenadora da Residência AU+E. Também compareceram representantes dos órgãos parceiros Sepromi (Secretaria de Promoção da Igualdade Racial da Bahia), Defensoria Pública e Conselho Pastoral dos Pescadores.
"Extensão se faz fora do espaço físico da universidade, trocando saberes. Vocês, moradores, têm muito a contar e a ensinar: entendam essas doações como uma troca. Não somos os 'sabichões'", enfatizou a professora Naia Alban. A coordenadora Ângela Gordilho destacou o valor pedagógico do trabalho de campo na qualificação profissional dos residentes: "A Universidade não é órgão público com função de fazer projeto técnico, mas é papel da Universidade sim dar apoio técnico às comunidades que precisam. O trabalho em parceria com as comunidades ensina muito aos profissionais que cursam a Residência".
Membros da comunidade do Rio dos Macacos destacaram a importância dos projetos como instrumentos na continuação da luta pela permanência e reconhecimento da posse da terra, alvo de contenda com a Marinha desde os anos 1970, quando a Base Naval foi instalada na área onde viviam os remanescentes de quilombolas. Após longa disputa judicial, o INCRA reconheceu, em novembro de 2015, a posse de uma parte do terreno, de 104 hectares, à comunidade. "Só temos a agradecer à UFBA por ter mandado 'os meninos' [residentes] para trabalhar com a gente", afirmou a moradora Olinda dos Santos.
Residência AU+E
Paula, Luana e Leonardo são os três primeiros concluintes da turma inaugural da Residência AU+E, aprovada pela UFBA em 2011 e implementada em 2013. Idealizada pela professora Ângela Gordilho, membro do PPGAU e aposentada da FAUFBA, a Residência é voltada a profissionais recém-formados, visando o aprimoramento na prática, por meio do trabalho de campo orientado por docentes da FAUFBA, do conhecimento profissional adquirido na graduação. "A ideia é semelhante à das residências médicas, só que direcionada a outra área do saber", resume Gordilho.
A proposta da Residência Técnica AU+E é ampliar o escopo de atuação profissional dos profissionais de Arquitetura, Urbanismo, Engenharia e áreas correlatas, buscando responder aos anseios de profissionais e movimentos sociais de conquista de moradia digna, viabilizando a capacitação e a assistência técnica frente à ampla e complexa problemática urbana nas cidades brasileiras. Além da Comunidade do Rio dos Macacos, os residentes da primeira turma - de 20 profissionais - têm atuado em parceria com sete outras comunidades em situação de risco em Salvador e Região Metropolitana. A segunda turma, de 25 graduados, tem trabalhado com outras seis comunidades. Segundo Gordilho, a iniciativa da AU+E "é algo inédito no Brasil, que esperamos que se espalhe não só por outras unidades da UFBA, mas para outras áreas do saber, por todo o Brasil. Já estamos inclusive conversando com outras universidades, no sentido de doar nossa metodologia."