A aula inaugural do segundo semestre de 2019 na UFBA, promovida pelo Sindicato dos Professores das Instituições Federais de Ensino Superior da Bahia (Apub), Sindicato dos Trabalhadores Técnico-Administrativos em Educação das Universidades Públicas Federais no Estado da Bahia (Assufba) e Diretório Central de Estudante (DCE) da UFBA, foi realizada na quinta-feira, 08 de agosto, no Salão Nobre da Reitoria.
“Universidade, Democracia e Política” foi o tema do evento, que contou com exposições do reitor João Carlos Salles, do economista e político brasileiro Márcio Pochmann, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e da professora Georgina Gonçalves, da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB). O evento contou ainda com a participação parlamentares baianos, entre os quais Alice Portugal, Hilton Coelho e Olívia Santana.
O reitor João Carlos Salles apresentou o texto “O futuro da Universidade”, que dedicou à professora Georgina, reitora eleita – e não nomeada pelo governo federal – da UFRB. Salles disse que a universidade tem sido alvo de incompreensões por parte daqueles que propõem falsas escolhas, como, por exemplo, a precedência da técnica sobre a cultura, da ciência aplicada sobre a ciência básica.
O reitor destacou a importância da produção científica autônoma, que não deve estar subordinada aos interesses do mercado, e lembrou que ainda não foram cumpridas as promessas de inclusão e expansão da universidade, de ampliação de direitos e promoção da diversidade.
Salles criticou a intenção de remanejar quase R$ 1 bilhão bloqueado das instituições federais de ensino superior para pagar emendas parlamentares, em face à defasagem orçamentária das universidades federais nos últimos anos. Defendeu a aposta irrestrita na educação e na ciência como saída para um país em crise como o Brasil, apontando a Educação como “um investimento da sociedade em seu futuro”.
O comprometimento da aura da universidade – em razão do desrespeito ao valor da pesquisa, ao mérito acadêmico e às suas instâncias democráticas, foi assunto mais uma vez abordado pela fala do reitor. “A vida universitária incomoda pelo conhecimento produzido e pelo desenho democrático e crítico de nossas relações”, avalia.
Sobre o Future-se, programa do governo federal para as universidades públicas, Salles sinalizou a falta de estudos de viabilidade prévios e da escuta dos principais interessados no assunto, a comunidade universitária, o que seria natural em um processo democrático. Para o reitor, um programa para as universidades federais não pode deixar de garantir a unidade, autonomia, diversidade e expansão do sistema e não acentuar as suas desigualdades.
Salles fez referência a valores inegociáveis, ponderando que qualquer programa valerá na medida dos valores que pretende realizar e não apenas pelos resultados imediatos e pelos recursos que sejam capazes de captar. “Não somos um negócio”, alertou. Defendeu ainda valores civilizatórios e a urbanidade na produção do convencimento, em oposição ao uso da força numa atmosfera de crescente violência e descaso com o outro. “Somos feitos de nosso povo, da concretude de nossa cultura e nossa história”, reafirmou.
Em seguida, Georgina Gonçalves destacou a importância da universidade pública para os cidadãos e para o futuro do país, que precisa ser defendida por todos diante dos ataques que vem sofrendo. Sugeriu a articulação da comunidade acadêmica e a atuação em espaços diversos como os sindicatos e as associações de classe. Ela acredita que a decisão de retirar recursos das universidades faz parte de um projeto que pretende asfixiar as instituições.
Em relação ao recente processo eleitoral para os cargos de reitor e vice-reitor da UFRB, falou sobre a mobilização da comunidade, que apoiou sua candidatura com mais de 80% dos votos. “A vontade da comunidade não foi respeitada. Isso demonstra a vontade de subjugar a Universidade”.
Professora concursada da UFRB, ela disse que retornará à sala de aula e continuará se empenhando para que o conhecimento produzido pela instituição possa contribuir com o futuro da nação. Georgina lembrou que a UFRB tem ajudado o desenvolvimento da região desde a sua fundação, há 14 anos, e tem estudantes com perfil socioeconômico diverso, com muitos filhos das classes C, D e E, pretos e pardos.
Por fim, ela garantiu que a comunidade acadêmica está unida e disse que contribuirá com o reitor nomeado na defesa da universidade que “foi desejada pelo povo do Recôncavo na luta por sua independência”.
Também participou da aula inaugural o professor Márcio Pochmann, que observa na atual conjuntura da sociedade brasileira interferências vindas de fora do país para impor uma série de mudanças. São grandes corporações internacionais que procuram até mesmo alterar o quadro regulatório do país, subordinando seus governantes aos interesses do mercado, afirmou. Nesse contexto, por exemplo, os trabalhadores teriam que escolher entre ter diretos ou empregos, em um movimento crescente de flexibilização das leis trabalhistas. E, assim, também se pretende destruir os sistemas de ensino, de ciência e tecnologia do país.
Pochmann observou ainda que o Brasil esteve por muito tempo ao logo de sua história dependente de ciclos econômicos motivados pela exportação de matérias primas para atender mercados externos, comandado por uma elite sem qualquer compromisso com o conjunto da nação e sem um projeto de desenvolvimento nacional. Ele defendeu a reforma agrária, criticou a grande concentração de terras no país e a atuação dos ruralistas que elegeram quase 300 parlamentares nas últimas eleições para interferir na agenda pública do país de acordo com os seus interesses pessoais.
Fonte: